sábado, 29 de março de 2008

Uma escola para cada um

Nos séculos XVII e XVIII, o movimento iluminista fez o Futuro descer do céu para a terra. Até aí, o caminho da humanidade era para Deus: a vida era uma etapa para atingir uma outra, mais verdadeira e redentora, debruada a leite e mel. O pensamento ocidental guiava-se, mais ou menos atavicamente, pela máxima de Santo Agostinho: “Somos cá em baixo viajantes que suspiram pela morte.”(...) O homem emancipado, para retomar a expressão de Kant, seria aquele capaz de fazer uso da sua razão. Daí – da necessidade de a cultivar e desenvolver – a importância atribuída à educação.Não era, no entanto, no homem enquanto sujeito individual que os iluministas pensavam. Dizer homem era dizer humanidade. Era o todo, e não as partes, o que estava no centro do seu pensamento. Ainda assim, essa abstracção em movimento tinha, à cabeça, quem a representasse, uma classe social em plena afirmação: a elite burguesa, interessada em substituir o privilégio do sangue pelo privilégio do mérito. Nas suas mãos, a educação tornar-se-ia uma arma de afirmação social, conferidora de estatuto e garante de respeitabilidade.Um privilégio, pois. Ao alcance de poucos. (...) a escola e a educação formal parece apontar para um novo horizonte: a escola para cada um. Uma escola como uma espécie de comunidade maiêutica onde, imunes a qualquer constrangimento social, todas as crianças dos seis aos quinze anos pudessem traçar os seus próprios percursos educativos, desenvolvendo áreas do seu interesse – fossem elas as profecias do Bandarra, o mundo asséptico, bem vestido e sem cérebro dos “Morangos Com Açúcar” ou os cestos divinatórios da Zâmbia – e escolhendo os mestres - a internet, claro, congrua que dispensa do pensamento - que melhor as orientassem nesse percurso de autoconhecimento. Um coelho branco anda por aqui a saltar à espera da sua Alice...Exige-se da escola que compense a sociedade. Que seja um laboratório para amanhãs que cantam. (Tontos que nunca na vida enfrentaram uma chusma de criaturas imbecilizadas dentro de uma sala de aula!) (...) A educação já não salva do mundo. Tornou-se parte integrante dele, tão analfabeta e cobarde como tudo o resto nesta piolheira - razão tinha aquele, morto há cem anos! - sempre parolamente assoberbada pelo novo, pelo moderno, sem nunca verdadeiramente o incorporar.O tempo fechou-se sobre esta voragem de futuro, que mais não é senão um presente contínuo sem esperança, atávico, vil.
(...)

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